Thursday, June 12, 2008

Pierrot by Angela Vicedomini


ARLEQUIM:
Dize: Queres-me bem?
PIERROT:
Fala: gostas de mim?
COLOMBINA, hesitante:
Eu amo-te , Pierrot...... Desejo-te, Arlequim...
ARLEQUIM, soturnamente:
A vida é singular! Bem ridícula, em suma... Uma só, ama dois... e dois amam só uma!..
COLOMBINA , sorrindo e tomando ambos pela mão:
Não! Não me compreendeis... Ouvi, atentos, pois meu amor se compõe do amor dos dois... Hesitante, entre vós, o coração balança:
A Arlequim:
O teu beijo é tão quente...
A Pierrot:
O teu sonho é tão manso...
Pudesse eu repartir-me e encontrar a minha calma dando a Arlequim meu corpo e a
Pierrot a minh’alma! Quando tenho Arlequim, quero Pierrot tristonho, pois um dá-me o
prazer, o outro dá-me o sonho! Nessa duplicidade o amor todo se encerra: um me fala do
céu... outro fala da terra! Eu amo, porque amar é variar, e em verdade toda a razão do
amor está na variedade... Penso que morreria o desejo da gente, se Arlequim e Pierrot
fossem um ser somente, porque a história do amor pode escrever-se assim:
Um sonho de Pierrot...
E um beijo de Arlequim!

Menotti Del Picchia

Wednesday, June 11, 2008

Washout by Ron Skei


Fico admirado quando alguém, por acaso e quase sempre
sem motivo, me diz que não sabe o que é o amor.
eu sei exactamente o que é o amor. o amor é saber
que existe uma parte de nós que deixou de nos pertencer.
o amor é saber que vamos perdoar tudo a essa parte
de nós que não é nossa. o amor é sermos fracos.
o amor é ter medo e querer morrer.

A Criança Em Ruínas, de José Luís Peixoto

Tuesday, June 03, 2008

Sonhei contigo

Morning Fog May 1988 by Angela Bacon Kidwell

Sonhei contigo embora nenhum sonho
possa ter habitantes tu, a quem chamo
amor, cada ano pudesse trazer
um pouco mais de convicção a
esta palavra. É verdade o sonho
poderá ter feito com que, nesta
rarefacção de ambos, a tua presença se
impusesse - como se cada gesto
do poema te restituisse um corpo
que sinto ao dizer o teu nome,
confundindo os teus
lábios com o rebordo desta chávena
de café já frio. Então, bebo-o
de um trago o mesmo se pode fazer
ao amor, quando entre mim e ti
se instalou todo este espaço -
terra, água, nuvens, rios e
o lago obscuro do tempo
que o inverno rouba à transparência
da fontes. É isto, porém, que
faz com que a solidão não seja mais
do que um lugar comum saber
que existes, aí, e estar contigo
mesmo que só o silêncio me
responda quando, uma vez mais
te chamo.

Nuno Júdice